Capítulo 1 Cabeça debaixo do meu pé
"Isabella! É aqui que tudo termina!"
A voz de Stella Thornton cortou o ar fino da montanha. Antes que Isabella pudesse se virar, um empurrão brutal atingiu suas omoplatas.
O chão desapareceu sob seus pés.
Ela caiu para frente, o mundo se transformando em um borrão de vento e pedra. O ar rasgou seu cabelo, jogando-o sobre seus olhos. A face do penhasco passou rapidamente em listras irregulares de cinza e branco.
Acima, Stella deu um passo até a borda, sua sombra se derramando no abismo. Muito abaixo, um mar inquieto de névoa fervia e rolava, engolindo a luz, engolindo tudo.
"Uma bastarda fingindo ser uma Thornton? Não me faça rir. Eu sou a única filha verdadeira desta família. Você deveria culpar sua sorte amaldiçoada, Isabella—uma vez que você se for, tudo o que você tem será meu."
Ela limpou a sujeira das palmas das mãos, agachou-se e lançou duas pedras do tamanho de punhos no vazio. Elas passaram gritando pela cabeça de Isabella, perto o suficiente para mexer o cabelo em sua têmpora.
Isabella se agarrou a uma videira que saía da parede do penhasco, os lábios se curvando em algo entre um sorriso e uma careta. Ela havia dito a si mesma por anos que tinha ouvido errado—que nenhuma família poderia tramar a morte de seu próprio sangue.
Mas a segunda tentativa de Stella não deixou espaço para dúvidas.
Ela não era sangue deles, afinal.
Dezoito anos antes, Gareth Thornton e Julia Winslowe tiveram uma filha—Stella. Ela foi o milagre deles após anos de casamento sem filhos, mas veio ao mundo frágil, pesando pouco mais que um pãozinho aos um mês de idade.
Um feiticeiro errante de Cascadia deu uma olhada nela, olhou em sua bola de cristal e pronunciou uma sentença: ela não viveria para ver os dez anos.
Pânico. Desespero.
O feiticeiro ofereceu uma saída—encontrar outra menina nascida no mesmo mês, roubar sua sorte, e Stella viveria.
Gareth pagou cem mil dólares no mercado negro por uma recém-nascida que acabara de nascer.
O nome dela era Isabella.
A saúde de Stella não se recuperou da noite para o dia. Dois bebês significavam o dobro de trabalho, e a paciência de Julia se desgastou rapidamente. Ela começou a deixar Isabella passar fome, deixando-a tremer no frio.
Para a surpresa de Julia, Isabella resistiu—e Stella começou a prosperar. Mais leite, mais peso, menos convulsões. Na mente de Julia, o sofrimento de Isabella era remédio.
A partir de então, a vida de Isabella foi fome e frio.
Suas primeiras memórias eram de pratos vazios e cobertores finos. Um inverno amargo, um velho desafiou a família e a levou para sua fazenda. Ela começou a se curar.
Mas a cada poucos anos, Julia levava Stella para visitar. E cada vez, o desastre acontecia—picada de cobra, quase afogamento, até mesmo raio.
Uma noite, buscando água, Isabella parou do lado de fora da porta de Stella.
"Ela é uma perdida que ninguém quis!" A voz de Stella era afiada. "Não vou deixá-la ficar nesta casa. Cada vez que ouço um criado chamá-la de 'Senhorita Thornton', me dá náuseas. Pai, mãe, quero ela fora antes do meu aniversário."
Ela acrescentou, "Vocês não vão começar a se importar com ela só porque ela está aqui há algum tempo, né?"
No meio da noite, Isabella levantou para beber água quando ouviu vozes vindo do quarto de Stella, ao lado.
Julia, segurando os ombros de Stella com preocupação, disse, "Que absurdo você está falando? Ela não merece nossa simpatia — nem minha, nem de seu pai."
Sua voz era suave. "O feiticeiro disse que você deve sobreviver a cinco perigos. Falta um. Se ela morrer cedo demais, quem enfrentará o último por você?"
"Não me importa. Amanhã eu faço dezoito anos. O feiticeiro disse que se eu sobreviver ao dia, viverei até o fim dos meus anos. Ela nem sabe sua verdadeira idade. Amanhã eu a levarei para as montanhas... e ela vai cair. Eu vivo. Ela desaparece. Combinado?"
"Combinado. Leve o guarda-costas de seu pai, Asher Holden. Não arrisque nada. Se necessário, deixe que ele cuide disso."
A voz de Gareth, suave e sonolenta. "Está tarde. Se Isabella nos ouvir, teremos problemas. Boa noite, minha preciosa Stella. Que tal uma história para dormir?"
"Claro, pai. Você é o melhor pai do mundo."
Isabella estava no corredor, olhando para a luz amarela quente que se espalhava pelo quarto. Um gelo percorreu suas veias.
Nada disso havia sido acidente. Até mesmo seu avô Jace perder o braço para um raio—salvando-a—havia sido parte do custo.
Todos na família Thornton, exceto Jace, eram monstros.
Ela pensou em fugir. Mas não estava pronta. Dezoito anos sob o teto deles a haviam ensinado paciência—e deixado com a leve, tola esperança de que ela estivesse errada.
Então, quando Stella a convidou para uma caminhada no dia seguinte, ela disse sim.
Antes disso, ela ligou para sua professora em Cascadia, Jenny Manners.
"Menina estúpida! Alguém está tentando te matar e você ainda amolece? Você é minha aluna! Com os feitiços de proteção e ligação que te ensinei, você poderia matar sua chamada irmã cem vezes!"
"Jenny, da última vez você disse que se eu fosse para Cascadia, você me acolheria. Isso era verdade?" A voz de Isabella carregava o mais leve sorriso.
Ela não era frágil—apenas atordoada.
"Claro que é verdade! Quando você tinha quinze anos, presa naquela cama de hospital depois da avalanche, eu te disse que sua irmã não estava destinada a você. Ela estava afundada em uma maldição de pura má sorte. E o que você disse? Que ela era sua verdadeira irmã e você a purificaria. Se eu não gostasse tanto de você, teria rachado sua cabeça só para ver se estava cheia de merda de cavalo."
"Tá bom, Jenny, não fique brava. Eu venho aprendendo feitiçaria com você há anos. Se alguém tentar me machucar, vou revidar. Quero encontrar meus verdadeiros pais. Se eu conseguir, vou perguntar por que me abandonaram. Então irei para Cascadia e trabalharei na Watts Academy, como você disse."
"Estarei esperando, Isabella."
A memória se desfez.
Não ouvindo nada acima, Isabella começou a descer pela trepadeira. As fibras ásperas arranharam suas palmas. Logo suas botas encontraram algo sólido.
"Aqui embaixo!"
Uma voz masculina, profunda e firme, subiu de baixo.
Isabella olhou para baixo—e percebeu que estava pisando na cabeça de um homem.














































































































